Ontem entramos na Cidade Proibida. Nós e, posso dizer com toda certeza, centenas de chineses e alguns laowai (estrangeiros) como nós. O lugar estava cheio, mas o passeio foi tranqüilo. É incrível visitar mais uma parte da história da China que só conhecia através dos livros. A Cidade é tão grande, com tanta coisa, que é difícil escolher o que ver primeiro, dentre tantos palácios, jardins e pequenos museus que contam parte da história dos monarcas das Dinastias Ming e Qing. Tem muita coisa bonita e muita coisa de gosto duvidoso. Mas gosto é gosto e cada um tem o seu. E os imperadores adoravam um dourado, vermelho, amarelo. Amarelo, por sinal, era a cor destinada ao Imperador.
Mas porque esse nome, “Cidade Proibida”? Hora da pesquisa: o imperador morava ali juntamente com sua família, suas concubinas, centenas de serviçais e os eunucos (homens que tinham o pênis e os testículos cortados e que tomavam conta das amantes do imperador). Por conta do forte sistema de segurança que controlava a entrada e saída de pessoas do local, muitos dos funcionários que viviam na cidade nunca chegavam a colocar os pés fora da cidade. Somente o imperador e alguns conselheiros reais e militares tinham liberdade para entrar e sair . Durante 500 anos a Cidade Proibida foi uma espécie de clausura para 24 imperadores que dali controlaram a China.
Superstição, misticismo, feng shui, confucionismo... é possível encontrar um pouco de tudo isso espalhado pela Cidade Proibida. Nada está ali por acaso. Tudo tem um significado. O número de colunas de cada palácio; os detalhes nas pontas dos telhados; os animais que guardam cada local; a arquitetura presente sempre busca a harmonia entre o homem, a natureza e o divino. É só dar uma olhadinha em alguns dos nomes presentes dentro da Cidade Proibida: Porta da Suprema Harmonia, Hall da Harmonia Central, Hall da Suprema Harmonia, Hall da Preservação da Harmonia, Porta da Pureza Celestial, Palácio da Pureza Celestial, Hall da União, Palácio da Tranqüilidade Terrena, Palácio da Longevidade Tranqüila, Porta das Façanhas Divinas, Palácio da Abstinência, Hall do Refinamento Mental, Hall dos Mil Outonos, e por aí vai. Tudo muito zen.
Foto Panorâmica das cinco pontes de mármore, símbolo das cinco virtudes do confucionismo.
Hall da Harmonia Central.
O colégio pediu e nós tiramos a foto num ponto turístico.
Leõa de Guarda na frente da Porta da Suprema Harmonia
Esculturas usadas para a colocação de incenso.
Esses caldeirões eram usados para apagar incêndios.
Detalhe dos Guardiões do Telhado
Um dos muitos tronos dos palácios da Cidade Proibida.
Pista de Mármore. A rampa central, esculpida com dragões em busca de pérolas, era reservada somente ao imperador.
A Cidade Proibida é um local limpo, como todos os que já visitei até agora por aqui. Mas me chamou a atenção à má conservação das mobílias, tetos, paredes. Alguns móveis não vêem um paninho de pó há muito tempo! Tudo bem que são coisas antigas, mas podiam estar mais bem cuidadas. Existem vários “becos” nas laterais da cidade que parecem coisa velha, mesmo. Uma pinturinha cairia bem. Mas apesar desses detalhes, o local é bonito e, o mais importante, é pura história. Lá dentro não pude deixar de pensar como o meu Pai gostaria de visitar aquele lugar. Ele que sempre me deu verdadeiras “aulas” de história e me mostrou o mundo em seus inúmeros livros na biblioteca lá de casa. Ele vai estar vendo as fotos, mas como seria bom que pudesse estar aqui pra ver, junto com a Mamãe, um pouquinho desse outro lado do mundo.
Liteira usada para transportar o imperador.
Robe de seda com detalhes em ouro usado pelo imperador.
Entrada para os Jardins Imperiais.
Um dos pavilhões dos Jardins Imperiais.
Detalhe do teto de um dos pavilhões.
Elmo usado pelos imperadores.
Num dos "becos" da Cidade Proibida.
Dinheiro acumulado em um dos lagos congelados dos Jardins Imperiais.
Montanha da Elegância Acumulada. Que nome, hein?
Escultura de elefante na saída norte da Cidade Proibida.
Saída norte.
Depois de umas três horas num sobe e desce escadas, entra e sai em palácios e jardins e muitas dezenas de fotos, fomos visitar o Parque Jing Shan (Colina da Vista ou da Paisagem) que fica bem em frente à saída norte da Cidade Proibida. Muitos chamam o local de Colina do Carvão, porque parece – não é comprovado - que armazenavam carvão do sopé da montanha. Na realidade a colina foi criada com a terra escavada na construção do palácio da Cidade Proibida. O local servia para proteger os palácios imperiais das influências malignas do norte – coisa do feng shui.
Parque Jing Shan visto da saída norte da Cidade Proibida.
Subir os degraus que levam ao alto da colina cansa. São degraus estreitos, para pezinhos chineses. Tentei subir de dois em dois, mas confesso que me cansei do mesmo jeito. A falta de preparo físico e o frio deixaram as pernas duras. Parei várias vezes num trajeto de 180 metros. É uma boa subidinha. Mas o esforço vale a pena quando se chega lá em cima. A vista é muito bonita. É possível visualizar Beijing numa visão de 360 graus. Pena que o tempo estava meio nublado e atrapalhou um pouco. Se a Cidade Proibida já impressiona lá embaixo, imagina como é bonita vista lá de cima. Parece não ter fim. É um complexo enorme!
A construção principal do alto da colina Jing Shan abriga um Buda enorme, todo dourado. É o Pavilhão das Dez Mil Primaveras. Não é permitido tirar fotos da estátua. Uma pena. Vi alguns chineses se ajoelhando para reverenciar o Buda. Os chineses não costumam ter uma religião, já que o Partido prega o ateísmo – e o culto as religiões é controlado. Mas a cultura chinesa tem suas filosofias, como o Budismo, Confucionismo, Taoismo. Os chineses são politeístas, ou seja, crêem em mais de uma divindade.
Pavilhão principal do Parque Jing Shan.
No alto da colina há ainda dois pavilhões menores nas laterais. Lá em cima, um chamariz para os visitantes: tirar foto vestido(a) como imperador ou imperatriz. Como verdadeiras e boas turistas, eu e Gigi – a Amanda não foi ao passeio - aproveitamos pra nos vestir de Imperatriz. Vale o mico.
"As imperatrizes".
Na descida conhecemos o local onde Chongzhen, último imperador da dinastia Ming se enforcou, aos 34 anos, em 1644. A placa no local indica que aquela ainda é a árvore que ele usou para se enforcar. Mas há relatos de que a árvore original foi cortada e substituída por outra. Será que ela é falsa? Bem, como estou na China, tudo é possível! Ah, esses chineses! Mas, voltando à história de Chongzhen: ao perceber que a cidade estava sendo invadida por rebeldes e que não tinha como se render, o imperador matou com as próprias mãos toda a sua família, exceto o príncipe herdeiro que ordenou que levassem para um local seguro, e fugiu para o Parque Jing Shan, juntamente com seu principal eunuco, Wang Cheng’em. Em sinal de lealdade, o eunuco se enforcou ao lado do imperador. Chongzhen deixou uma carta dizendo a seus algozes que podiam fazer o que quisessem com seu corpo, mas que poupassem a população civil de qualquer mau trato. O imperador Chongzhen virou herói do povo.
Árvore onde Chongzhen se enforcou.
Pavilhão principal e o pôr do sol.
A China imperial não era muito diferente dos impérios e países do ocidente. Os poderosos tinham tudo, conforto, mordomias, muitas mulheres. Uma vida completamente diferente daquela dos cidadãos comuns que viviam com inúmeras dificuldades. O tempo passou, o mundo mudou, evoluiu, mas algumas coisas, infelizmente, permanecem as mesmas, no Brasil, na China, em qualquer lugar.
Já assistiu ao filme “O Último Imperador”, do diretor italiano Bernardo Bertolucci? O filme, que retrata a vida do imperador Pu Yi, foi o primeiro longa-metragem a receber autorização do governo chinês para ser filmado na Cidade Proibida. Em 1988, recebeu nove indicações para o Oscar e ganhou todas elas.
Sinopse do filme: A saga de Pu Yi, o último imperador da China, que foi declarado imperador com apenas três anos e viveu enclausurado na Cidade Proibida até ser deposto pelo governo revolucionário, enfrentando então o mundo pela primeira vez quando tinha 24 anos. Neste período se tornou um playboy, mas logo teria um papel político quando se tornou um pseudo-imperador da Manchúria, quando esta foi invadida pelo Japão. Aprisionado pelos soviéticos, foi devolvido à China como prisioneiro político em 1950. É exatamente neste período que o filme começa, mas logo retorna a 1908, o ano em que se tornou imperador.