“Adeus, China!” Faltam poucas horas para eu dar “adeus” à China e a
Beijing. Foram 938 dias (2 anos, 6 meses e 28 dias) convivendo e aprendendo um
pouco mais sobre esse país de cultura milenar. Nunca havia vivido uma
experiência igual, de ficar tanto tempo longe do Brasil, e foi algo engrandecedor,
principalmente pelo fato de ter que viver num país tão diferente do nosso.
A China me surpreendeu em muitos aspectos. Quando eu pensava na “China”,
imaginava um país comunista, fechado, rigoroso, atrasado em alguns aspectos...
Errei em quase tudo. Comunista? O país pode ser governado por um Partido dito
“Comunista”, que prega o Socialismo, mas o quê vi, foi um grande país
“capitalista”. Basta olhar ao redor: lojas Gucci,
Channel, Prada, Louis Vuitton - só pra citar algumas das marcas mais famosas
que têm suas vitrines espalhadas pela capital chinesa; sem falar nas Ferraris, Porsches, Maserattis... BMW
aqui é “fichinha”; Chinês com iPhone
na mão? A
coisa mais fácil de se ver por aqui.
A China tem, sim, um governo linha dura, que controla o país, mantendo
as rédeas sobre a população bem curtas. “Liberdade”, no dicionário, tem como
primeira definição “direito de expressar
qualquer opinião e agir como quiser”. Aqui essa “liberdade” tem limites – o
que já deixa de ser “liberdade”. Mas como controlar tanta gente? Talvez somente
desse jeito. Mas como já falei em outras ocasiões, as coisas aqui funcionam e
andam pra frente, muito por causa dessa “rigidez” dos que governam o país.
Muitos outros dizem viver numa “democracia” e o quê vemos é uma anarquia, um
descontrole... Sei que vou sentir falta disso: de poder andar na rua sem medo
de ser assaltada, de poder usar a máquina fotográfica ou o telefone celular em
qualquer lugar, sem paranoia. Aqui não é o paraíso, mas quando alguém “pisa na
bola” é punido. Veja o caso do atentado de outubro do ano passado na frente da
Cidade Proibida que matou 15 pessoas: três terroristas morreram no ataque
suicida, e os demais integrantes do grupo foram logo descobertos, julgados e
condenados à morte. Esperar pra quê?
Político aqui, também quando é pego, dependendo do que fez, é cadeia ou
morte.
País atrasado? Nas largas avenidas de Beijing, o antigo e o novo se
misturam em sintonia: torres e muros antigos, juntos e misturados aos belíssimos
arranha-céus que não param de surgir no horizonte da cidade.
O chinês não economiza para transformar a capital e muitas outras
cidades do país, como Shanghai, em ícones da moderna arquitetura. Os
escritórios de arquitetura e engenharia mais famosos do mundo estão
enriquecendo com essa febre chinesa de construir prédios modernos, exóticos, um
sempre mais alto do que o outro... Uma loucura sem fim!
E quando falo do antigo e do novo juntos, não posso deixar de citar a
população anciã do país, que acorda cedo para se exercitar nos parques, seja
dançando, fazendo tai chi, ou mesmo ficando horas e horas jogando cartas ou o
tradicional Mahjongg com os amigos.
Enquanto isso os mais jovens “correm” pela cidade a caminho de seus
empregos, a caminho de um eldorado atualmente alcançável para muitos. Só que
muitos, aqui, não significa grande coisa. Milhões, sim! A realidade de Beijing,
uma metrópole moderna, contrasta com a realidade do interior do país,
onde ainda existe muita miséria. Difícil tornar perfeito um país com mais de 1
bilhão e 300 mil pessoas - o Brasil inteiro ultrapassou recentemente a casa dos
200 milhões de habitantes – esse é mais ou menos o número de pessoas
consideradas na linha da pobreza aqui na China: ou seja, um Brasil inteiro de
pobres.
Beijing, a capital, é a segunda cidade mais populosa do país, com 21
milhões e 500 mil habitantes (de acordo com dados de 2013). A primeira é Shanghai, com 24 milhões 150 mil
pessoas. A “Paris do Oriente” é também a cidade mais populosa do mundo! Só pra
comparar, São Paulo, a maior cidade do Brasil tem cerca de 12 milhões de
habitantes.
A população das grandes metrópoles chinesas não difere muito da de
outros países, com engravatados andando pelas ruas, mulheres bem vestidas... Se
bem que “bem vestidas” depende muito do ponto de vista de cada um. A moda
chinesa não segue regras. Se a chinesa gosta de usar roxo com laranja, com
estampas floridas e quadriculadas, tudo junto, ela não está nem aí. Isso é que
eu chamo de personalidade! Nada de se importar com o quê os outros vão achar.
Bem legal, por mais que fique, na nossa opinião de
“ocidentais-metidos-a-entender-de-tudo-e-metidos-a-besta”, um pouco estranho e
fora de contexto.
O chinês não tem maldade na cabeça. Você pode entrar no metrô lotado,
que o chinês que está atrás de você não vai ficar “se roçando” como os tarados
que cansamos de enfrentar no Brasil, em situações parecidas. Eles respeitam as
pessoas. As mulheres costumam andar de mini-mini-saia. Roupa bem curtinha e
justa, mesmo. Pensa que alguém faz “fiu-fiu” ou fica “comendo” as meninas com
os olhos, ou mesmo vai lá e passa a mão? Não! É cada um na sua. E o quê dizer
das mulheres amigas, parentes, que andam na rua de braços dados? No Brasil já
diriam: “gays”!
Não, gente. A China não é uma perfeição. Está longe disso. Mas o governo
daqui – por mais controverso que seja seu regime – procura fazer as coisas em
benefício da população. Andar pela China é ver obras e mais obras, a construção
de prédios e mais prédios residenciais. Para aumentar seu PIB – Produto Interno
Bruto – o governo está construindo moradias para tirar a população do campo e
trazer para a cidade. Os chineses mais simples ainda estão reticentes com essa
ideia e preferem continuar no campo. Acabam não se adaptando às cidades
grandes.
Cidades grandes que não param de crescer, de modernizar seus sistemas de
transportes, das ferrovias aos aeroportos... Tudo de mais moderno que possa
existir.
Depois de morar aqui, posso dizer, com certeza, que a China é um gigante
que não tem pressa de acordar e dominar o mundo. No passado, quando podiam ter
expandido suas conquistas, eles preferiram apenas viver em seu canto, no centro
do mundo, como chamam o país – Zhōngguó – “País do Meio”. Mas aos pouquinhos os
chineses vêm entrando aqui e ali, injetando milhões em outros países, levando o
mundo “no bico”, fazendo o estrangeiro comer na palma de suas mãos. Só para
lembrar: a China é a segunda maior economia do mundo, atrás apenas dos Estados
Unidos. Mas essa liderança americana não deve durar muito.
E parem com esse papo de dizer que chinês copia tudo. O mundo é que
copiou muita coisa deles. E eles agora só estão dando o troco!
Arquitetura, carros, vestuário... Não posso deixar de falar de alguns
costumes chineses que nos assustam um pouco. Cuspir na rua é o pior deles. Não
dá pra se acostumar. Se escuto um “rrrggghhhh”, me arrepio e viro a cara, para
não ver o que não quero! Aqui não é questão de educação, mais de cultura. Eles
acreditam que não devem manter dentro deles as coisas ruins... Que elas devem
ser colocadas pra fora! Fazer o quê? Não dá pra mudar uma cultura milenar.
Comer chupando a comida ou enfiando a cara no prato? Normal por aqui.
Não me acostumo, mas aprendi a respeitar. Mais uma vez, “fazer o quê”?
Por falar em comida: agora dá pra entender porque as chinesas tem um
corpo, quase sempre, magrinho, sequinho... É muito chá, água quente, verduras,
frutas... Eles comem algumas frituras, mas no geral têm uma alimentação menos
“gordurosa” do que a maioria dos ocidentais – apesar da recente chegada das
redes “fast food” e da grande
variedade de restaurantes estrangeiros. Mas a população mais pobre – a maioria
– é bem tradicional.
Ficar na fila? Pode ficar à vontade que todo mundo vai te passar a
frente se tiver uma oportunidade. As coisas estão melhorando, mas em alguns
lugares ainda é difícil não ver um chinês te passando a perna!
O quê pode melhorar por aqui? Bem, eu diria, acabar com a poluição que
atinge níveis exorbitantes, tentar acabar com os engarrafamentos, ter uma
internet mais rápida e livre – dá vontade de “se rasgar” com a lentidão da
conexão.
Aprendi que chegar em algum lugar por aqui, falando um pouquinho de
chinês, abre um monte de portas. Você é mais bem atendido, consegue negociar
melhor os preços... Mas também não se ache, porque quando eles cismam com
alguma coisa, sai de baixo. Nos mercados mais visitados a barganha começa
quando o vendedor(a) te dá um preço lá nas alturas e termina com uns dez por
cento do que começou a ser negociado. Algumas vezes é preciso muita paciência
pra ficar “chorando” o preço por vários minutos. Perde-se um tempão! Mas tem
também aqueles que fincam o pé e não reduzem muito o preço. Aí é “xiexie”
– obrigada -e pronto!
Mas nós, pelo menos, fizemos muitos “amigos” por aqui nessas longas
negociações. Temos nossos vendedores cativos pra todos os artigos e eles quase
sempre nos recebem com um sorriso, uma garrafinha de água, uma fruta, querem
que a gente deixe a Gigi com eles, de presente, e por aí vão as brincadeiras.
No final, todo mundo sai satisfeito. Para alguns já falei que estamos indo
embora, e eles demonstram tristeza. Sei que é porque vão ficar sem bons
compradores e também porque estamos sempre apresentando “novos clientes” pra
gastar Yuans em suas lojas, mas dá pra perceber um certo carinho na
atitude deles. Isso eu vi também na moça que trabalhava na nossa casa: a Wang.
Ela chorou quando a Amanda retornou ao Brasil em Janeiro desse ano, e agora, ao
nos despedirmos, disse que estaremos para sempre no coração dela. Me deu de
presente um jogo de chá pequeno de porcelana e não parou de abraçar a Gigi. São
momentos, lembranças e pessoas que levaremos para sempre em nossos corações, em
nossa memória.
O quê falar da Julia, a intérprete, e da Liu, a motorista? As duas
sempre nos ajudaram no que foi preciso. E não é porque meu marido era o
“chefe”, mas porque realmente existe muito carinho na convivência. Vamos sentir
saudades! Foram nossos “anjos da guarda” por aqui.
Além dos amigos chineses, levamos para sempre a amizade nascida aqui no convívio com outros brasileiros e estrangeiros, como argentinos, chilenos...
Além dos amigos chineses, levamos para sempre a amizade nascida aqui no convívio com outros brasileiros e estrangeiros, como argentinos, chilenos...
É até difícil terminar de escrever sem deixar que as lágrimas escorram
pelo meu rosto. Estou doida para retornar ao Brasil, mas sei que vou sentir
falta da China e desses amigos que fiz por aqui. Pena que é tão longe da gente,
caso contrário não seria mal uma visitinha de vez em quando. Acredito que na
vida nada é impossível, mas acho muito difícil voltar pra cá novamente. Mas
acredito que minhas filhas, elas sim, um dia voltarão e vão relembrar todos os
momentos que vivemos aqui. Tenham sido eles não tão bons ou maravilhosos. Vão
poder colocar em prática e relembrar o Mandarim que aprenderam. Uma experiência
que não tem preço!
Ao vir pra China tive que ficar longe de meus pais, o quê foi o mais
difícil nesse tempo. Acabei “perdendo” meu Pai, não podendo ficar com ele como
gostaria de ter ficado e de ter segurado “as pontas” com minha Mãe, como
queria. Mas a vida é assim: o destino nos reserva momentos bons e ruins, e o
quê a gente precisa é saber conviver e aprender com eles.
E falando em aprender, aprendi um pouquinho de chinês, usei bastante o
inglês, aprendi a comer melhor com o “kuazi”, os palitinhos daqui - apesar
de ainda apanhar e muito com certas comidas – aprendi ou desaprendi a
atravessar a rua no meio dos carros, andar de bicicleta na contramão... Me
diverti bastante. Agora, ao chegar ao Brasil preciso me reeducar em muita
coisa. A primeira delas? Não ficar falando qualquer coisa na rua, porque agora
as pessoas vão entender o que estou dizendo... “Ah... Já tô morrendo de
saudades da China!”
Zàijiàn, Zhōngguó!
Nǐ hǎo!
ResponderExcluirMuito bom seu blog. Em dezembro estou indo para China ficar um mês para tentar praticar um pouco de mandarim. Muito obrigado por compartilhar suas experiências. Com certeza elas vão me ajudar muito nesse curtíssimo período que vou passar por lá.
Zàijiàn!
Lindo teu blog e fotos amei ...Parabéns.
ResponderExcluirSou um amigo da China,gosto muito de seu blog,rsrsrs
ResponderExcluirOi, sou alucinada pela China. Pode me fornecer seu e mail ou contato p te escrever. Sou Dentista,gostaria passar anos na China. Me ajuda!! Grata
ResponderExcluirJacqueline