Já estou quase indo embora e ainda não tinha falado sobre algo muito popular
aqui desse lado do mundo, principalmente, na China.
Antes de vir para a Beijing, ao mencionar a palavra “chá”, eu me lembrava
sempre dos britânicos e seu tradicional “chá da tarde”. Nunca estive no Reino
Unido para comprovar essa tradição, mas depois de quase três anos morando em
Beijing, aprendi uma coisa: o costume inglês de beber chá pode até ser famoso,
mas acho que ninguém supera os chineses nessa questão de “apreciar” um
chazinho. E isso tem uma explicação: foram os chineses os “inventores” do chá.
Lá pelos idos de 2737 a.C. o chá era apenas uma bebida medicinal. Mas
isso mudou por volta do ano 300 da nossa era, quando o costume de colocar
folhas frescas em água fervente passou a ser um costume diário dos chineses.
A partir daí o chá, ou chá 茶, se espalhou pela
China e pelo Japão, chegando a Europa e a América somente nos séculos XVII e
XVIII.
Hoje em dia bebe-se chá em várias partes do mundo. A Índia, por exemplo,
é o segundo maior produtor mundial de chá. O primeiro é a China, claro.
Os primeiros europeus a conhecerem o chá foram os portugueses, quando
chegaram ao Japão, em 1543. Foram eles que levaram as primeiras folhas de chá
para o continente europeu.
Já os americanos adoram tomar chá gelado – o ice tea. Aqui na China passei a beber muito chá gelado nas
refeições – uma opção constante na maioria dos restaurantes. Gostei tanto –
abandonei o refrigerante – que faço também em casa. Eles chamam de bīng
hóngchá, 冰红茶, “chá preto gelado”.
O Ice Tea que costumo beber.
Nos restaurantes ele é natural e mais
gostoso, é claro.
Só que normalmente vem sem açúcar.
Os chineses realmente adoram chá. É comum eles andarem nas ruas com
garrafinhas de plástico ou metálicas, com chá dentro.
Os taxistas, por exemplo, têm sempre uma garrafinha com chá quente, ao
lado deles. O chinês não tem hora pra tomar chá, nem lugar. É como se fosse água para eles.
E não é chá de sachê/saquinho que eles usam: é chá feito com as folhas.
Os apreciadores da bebida afirmam que o melhor tipo de chá é realmente o
de folhas soltas. Ele é tradicionalmente colhido e processado, ao passo que o
chá de saquinho costuma ter folhas trituradas perdendo vários nutrientes que
existem nas folhas maiores. Além disso, o chá de saquinho traz várias partes da
planta, como folhas e talos. Isso diminui a concentração dos princípios ativos
da erva. O papel do sachê também pode interferir no sabor do chá.
Por aqui, há casas de chá espalhadas por toda a cidade. Alguns chás são
bem caros.
Banca de venda de chá no mercado HongQiao,
o Mercado das Pérolas.
Mas o que vem a ser o chá?
A Camellia sinensis – a árvore do chá - é um arbusto verde cujas
folhas, se não são logo secas depois de apanhadas, começam a se oxidar
rapidamente, ficando progressivamente escuras. O processo seguinte no processamento é parar o processo de oxidação num
estado predeterminado, removendo a água das folhas via aquecimento. O termo fermentação é frequente e muito usado para descrever este
processo, mesmo que na verdade nenhuma verdadeira fermentação aconteça.
Plantação de Camellia Sinensis...
...e a flor dela.
O chá chinês é classificado em seis categorias. Essa classificação faz
referência às cores das folhas após a infusão.
São eles os chás branco, verde, amarelo, vermelho, o azul e o Puerh.
O branco é apontado como o primeiro a ter surgido. É feito de folhas jovens,
que não sofreram oxidação/fermentação – não ficam escuras. O processo de
oxidação/fermentação é que dá a cor escura ao chá.
O verde, é não-oxidado/não
fermentado. Sua fermentação é evitada pela aplicação de calor, vapor. Nem
sempre ele é “verde”. Sua cor característica, depois de preparado, é o
amarelo-dourado.
O chá amarelo é o único não
relacionado ao processamento das folhas. Sua produção é semelhante a do chá
verde, mas com uma fase de secagem mais demorada. Como o amarelo era a cor do
Imperador, o chá imperial passou a ser o chá amarelo.
O chá vermelho é o chá preto
na concepção ocidental. Sua oxidação/fermentação é substancial.
O chá azul, também chamado de
Oolong, é semioxidado/semifermentado.
Fica num processo entre o chá preto e o chá verde.
O Pu-erh é o fermentado e um
dos mais caros e mais apreciados da China. Passa por um processo de fermentação
e envelhecimento. Ele chega a ser armazenado por cem anos. É considerado um chá
medicinal e é o chá usado na cerimônia de chá chinesa chamada Kung Fu Cha.
Eu gosto muito de chá, mas com açúcar, e aqui os chineses tomam chá
puro. Já provei alguns e só não fiz cara feia por educação. Mas também já
experimentei chás muito gostosos, como o que bebi no restaurante em que comemos
o Hot-Pot. Era um chá de rosas. Foi
servido na temperatura ambiente, mas era muito gostoso. Parecia até suco de
uva.
Mais uma vez vou me colocar a favor dos chineses. Eles inventaram o chá
e hoje em dia são copiados em todo o mundo. As variedades de chá espalhadas por
aí são inúmeras e variam de país para país. Chá de Camomila, Erva-doce, Sidreira, Boldo, Capim-limão, Chá de
Quebra-pedra, só para citar alguns mais comuns no Brasil.
Depois os chineses é que têm fama de copiar tudo, que ingratidão!
Veja essa história. Um inglês, o botânico Robert Fortune, na metade do século XIX roubou dos chineses o
segredo do chá. A Coroa Britânica lhe ofereceu, na época, 550 libras por ano,
para que ele viesse até a China, descobrir os segredos do chá chinês, que era
muito superior ao da Índia e que era consumido pelos ingleses. Fortune, depois dos portugueses, foi o
primeiro a entrar na China proibida. A China não via com bom grado a entrada de
estrangeiros em suas terras. Bem tinham razão. Fortune não só descobriu o segredo da fermentação dos chás, como
levou para Calcutá, na Índia, caixas e mais caixas com pés de chá.
Em 1866, 4% do chá consumido pelos ingleses vinham das
Índias. Em 1903, esse número passou a 59%. Foi um golpe duro para os
comerciantes chineses, que viram seus negócios com o chá caírem
vertiginosamente. Eles não compreendiam como os segredos do chá escaparam.
观音王 Guan Yin Wang
Essa "bolinha" na minha mão é uma das versões
mais populares do chá tipo Oolong.
São folhas de chá Tie Guan Yin enroladas à mão.
Tem sabor de orquídeas e é indicado
para afastar a fadiga e para prevenir a cárie.
É um dos muitos chás que ganhamos de presente.
Na primeira foto a "bolinha" está começando a abrir...
...E na segunda o chá está pronto. Parece uma flor que se abriu.
O chá Guan Yin Wang é
originário da província de Fujian,
na costa sudeste da China.
Algumas dicas para tomar chá:
Não deixe a água ferver.
Quando ela começar a entrar em ebulição – quando surgirem bolinhas no fundo da
panela – retire a água do fogo.
Despeje a água sobre as folhas
na xícara ou em outro recipiente e está pronto para ser apreciado.
Os chineses costumam apreciar
ainda mais a “segunda rodada” de chá, já que esta segunda infusão é considerada
a melhor do ponto de vista do sabor. Quando sobrar apenas um terço
ou um quarto de chá na xícara, coloque mais água quente até encher de novo.
Os chineses costumam tomar chá nessas xícaras
bem pequenas. O chá é servido com a água bem quente,
o que torna um suplício, pelo menos pra mim,
segurar essas xícaras sem tremer
e sem queimar as pontas dos dedos.
Quer saber mais sobre essa bebida que encanta os chineses? Dá uma olhadinha no link abaixo. É bem interessante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário